Naquele momento, o esquema era muito mais “ingênuo” que o atual, mas não menos destruidor para os cofres públicos.
Funcionava da seguinte forma:
Empresários de artistas sertanejos eram avisados por comparsas Brasil adentro sobre o desejo de uma prefeitura em contratá-los. O show seria para uma festa qualquer (geralmente aniversários dessas cidades, ou feriados nacionais).
Um empresário “atravessador” (também parte da quadrilha) corria na frente e comprava antecipadamente a data da festa que a cidade queria. Tudo um teatro canastrão, óbvio.
Quando as Secretarias de Cultura dos municípios consultavam a banda para o show, eram avisadas que a data, infelizmente, estava fechada. “No entanto”, tinham uma alternativa…
A alternativa era cobrar ainda mais pelo show, já que a data estava com “terceiros”, e o “coitado” do atravessador teria de dispensar outro contratante já interessado (e fictício) na mesma data .
O valor do superfaturamento era dividido entre toda a quadrilha.
R$ 168 milhões
Só até 2016, só o Ministério Público Federal de São Paulo estimava que o esquema de sonegação já havia desviado mais de R$ 100 milhões.
Seria o equivalente a R$ 168 milhões hoje, reajustados.
Mas, detalhe: esse valor se refere APENAS em um grupo de cidades na região de Rio Preto.
Segundo especialistas do MPF em SP, 90% desse dinheiro tinha como destinatários artistas sertanejos de renome; 10% só de outros estilos, como forró e axé.
Muitos desses artistas e duplas estão sendo investigados neste momento (23/10/22) pela Receita.
O motivo para a concentração de shows num estilo, segundo eles, seria que o esquema se instalou na década passada, quando o sertanejo universitário explodiu.
A propósito, como o site Ooops também é cultura, o estilo sertanejo que está aí nas rádios brasileiras é a 3ª vertente (e a mais pobre, musicalmente) do do estilo sertanejo original).
Procurador suspeitou
Quem suspeitou do esquema no final de 2014 foi o procurador Thiago Lacerda Nobre, do Ministério Público Federal em SP, quando visitava parentes no interior de São Paulo.
“Percebi que cidades minúsculas estavam contratando ‘medalhões’ da música popular. Pensei: não tinha como essas cidades de 12 mil, 15 mil, 20 mil habitantes terem dinheiro para bancar esses artistas”, afirmou a este colunista.
No entanto, elas tinham. Sabem como? Usando a comunista Lei Rouanet. ?
Alerta Vermelho
A descoberta de Nobre e sua investigação acabaram acendendo um alerta que se tornou paradigma em todos os Ministérios Públicos Federais dos Estados da Federação.
No entanto, os esquemas cresceram, se sofisticaram e ficaram muito maiores após a posse de Bolsonaro.
Naquele ano, este colunista também publicou com exclusividade que o Ministério Público Estadual no Ceará passou a investigar empresas, artistas, secretários e ex-secretários de Cultura e Eventos por sonegação e superfaturamento de shows.
Há centenas de casos em andamento, em todos os Estados. Mas o eixo SP, Rio, Goiás, Mato Grosso e Ceará são os mais volumosos.