Exclusivo – Banco do Brasil vendeu papel ‘podre’ aos seus clientes entre outubro do ano passado e fevereiro.
Foram dezenas de milhões de reais em CRAs (Certificados de Recebíveis do Agronegócio), emitidos pela empresa Zootec, do grupo Raça Agro.
A Zootec fica em Barra do Garças (MT) e produz e vende insumos agropecuários.
Pertence à família do senador Wellington Fagundes (PL-MT).
Senador Wellington Fagundes (PL), dono do grupo Raça Agro
BB vendeu papel podre
O BB ofereceu o papel como um “grande investimento”.
O comprador da CRA da Zootec receberia 1% do investimento em dividendos mensais, e o papel ainda “valorizaria”. De fato, subiu 11% (artificialmente) entre fevereiro e abril.
Só que o “investimento” durou apenas dois meses, pois o grupo Raça Agro, ao qual a Zootec pertence, e que está afundado em dívidas, anunciou que entraria em recuperação extrajudicial.
E vai piorar: com dívidas de quase R$ 300 milhões, o grupo Raça Agro caminha a passos largos para a recuperação judicial –ou coisa pior.
Em outras palavras, está tão no fundo do poço quanto uma Gol ou Americanas (cada qual por seus motivos distintos).
E, como toda empresa, vai tentar “renegociar” as dívidas. Leia-se: oferecer muito menos do que deve aos credores –especialmente os pequenos investidores que compraram a CRA.
Segundo especialista ouvido nesta terça pelo site, a empresa pode ser investigada por má-fé na emissão desses “debêntures”. Afinal, ela já sabia de sua situação periclitante.
Calma que vai piorar
Aos ingênuos investidores, o grupo Raça Agro não só suspendeu os dividendos: só agora eles descobriram que só 30% do papel tinha seguro.
Empresa já estava ‘quebrada’
Em outras palavras: neste momento, todos os clientes perderam 70% do que investiram num papel estimulado pelo banco público federal.
Quem investiu R$ 10 mil por exemplo, só tem garantia agora que receberá R$ 3 mil. E talvez nem isso.
E se o Raça Agro de fato declarar recuperação judicial, é possível que até esses 30% evaporem, já que serão suspensos todos os pagamentos de dívidas.
E não existe nenhuma garantia que não acabe, arruinados.
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Papel podre
Nenhum cliente foi informado pelos gerentes, segundo esta reportagem apurou, de que se tratava de um papel de altíssimo risco.
Muito menos que era um “CRA podre” (jargão financeiro para “papel sem valor”).
Tampouco explicam como uma instituição pode ter sido tão incompetente ao ponto de nem checar a situação da empresa para a qual emitiria a “debênture”.
Desde outubro do ano passado já havia rumores de que o grupo do senador do PL já estava na corda bamba.
Mesmo assim, o BB participou e incrementou a venda dos papéis “podres”.
BB não responde
Este site enviou uma série de perguntas à assessoria do Banco do Brasil, instituição que tem 216 anos.
Nenhuma das perguntas foi respondida. Ao contrário: é sugerido que os clientes procurem a “securitizadora” da dívida, a Eco Agro, para se informar.
Hoje (18), o BB informou que foi divulgado novo “fato relevante” pela “securitizadora”: vão prorrogar as negociações por mais 60 dias.
Leiam abaixo o outro lado; em seguida, a réplica deste veículo:
Outro lado – Banco do Brasil
“O Banco do Brasil tem como premissa prestar assessoria de investimentos isenta e aderente ao perfil de investidor de cada cliente. A oferta de produtos e ativos financeiros é realizada com a devida observância às normas regulatórias e a legislação vigentes.
Sobre nossa atuação no mercado de capitais, o BB possui uma governança robusta, técnica e altamente reconhecida no que tange à análise dos ativos que são disponibilizados ao público que deseja investir nesse mercado.
(parece press release)
São dezenas de papeis disponibilizados diariamente e de forma dinâmica, sem indução para comercialização de ativo em específico.
A rede de agências e escritórios do Banco do Brasil, por meio da atuação de gerentes de relacionamento e especialistas em investimentos;
Possui profissionais certificados e está preparada para prestar orientações e esclarecimentos sobre oportunidades para investimentos e assessoria financeira;
(que levam) em consideração o perfil, o objetivo e o horizonte de tempo de cada cliente investidor, assim como as condições de mercado vigentes.
Banco do Brasil seria cúmplice na emissão do papel “podre” da Zootec?
(dissertação sobre economia)
O mercado de crédito privado vem experimentando forte crescimento nos últimos anos e tem atraído cada vez mais investidores pessoa física;
(E) de diferentes perfis, que buscam uma remuneração acima das opções mais tradicionais da Renda Fixa, como fundos DI, CDBs e Letras de grandes bancos.
(segue)
Alternativas de maior expectativa de rentabilidade podem trazer riscos adicionais. No caso dos ativos de crédito privado, temos o prêmio pelo risco de crédito inerente a operação como fator diferencial de taxa.
Sobre o CRA em questão, no BB, a maior parte destes ativos adquiridos pelos investidores pessoa física foram negociados entre outubro e novembro de 2023.
Já em abril, próximo da data esperada para a apresentação do balanço de 2024 da empresa, foi divulgado Fato Relevante:
Nele, a Securitizadora informa o inadimplemento e a suspensão em juízo do pagamento dos juros.
Para maiores detalhes consultar o Fato Relevante, emitido no dia 16/04/2024.
“(“Ainda no prazo”)
Cabe destacar que a Securitizadora detém o dever fiduciário de defender os interesses dos investidores detentores do CRA e está participando das negociações que ainda estão ocorrendo dentro do prazo estipulado em juízo e sob sigilo.
(“Se virem”)
Ainda como informado no Fato Relevante, os titulares do CRA podem se comunicar com a Securitizadora nos canais ali citados.
Em observância ao sigilo bancário, não comentamos casos específicos de clientes e seguimos à disposição, por meio dos nossos canais de atendimento. Assessoria do BB”.
Réplica
“Nenhuma pergunta que fiz foi respondida. Com todo respeito, mas com o rigor jornalístico e sincero que me apego, o que estou recebendo é um release do Banco do Brasil e de seu corpo de funcionários.
E posso estar enganado, mas a recomendação é que o CLIENTE para quem o Banco do Brasil vendeu o papel “podre” vá se entender com a securitizadora do produto que o BANCO estimulou o cliente a comprar?
E que não alertou a NENHUM dos clientes ingênuos que eles estavam comprando um produto podre? Que poderiam perder suas economias?
Entendo o trabalho da assessoria de imprensa, respeito meus colegas e sei que não foram vocês que decidiram escrever isso. Grato”
Seja quem for, uma resposta irresponsável no sentido explícito da palavra.”
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