Muitos leitores que acompanham meu trabalho na cobertura de TV e famosos nos últimos 20 anos vivem me perguntando porque eu gosto tanto de patos.
Querem saber se é apenas brincadeira ou alguma obsessão mórbida de minha parte. Vá lá, eu confesso. Um pouco de cada uma.
Até já escrevi sobre isso na chamada grande imprensa (Folha de S.Paulo, 24 de novembro de 2011, caderno Comida), mas no lançamento deste site privado eu explico novamente.
ERA UMA VEZ…
Tudo ocorreu durante um almoço ou jantar, não lembro. Só lembro que ainda era muito pequeno, provavelmente uns quatro anos, porque lembro que ainda nem estava no parquinho (como chamávamos o Jardim da Infância).
Sentado à mesa, vi minha mãe colocar em meu prato um objeto fumegante de cor estranha, e imediatamente perguntei o que era aquela coisa suspeita. Minha mãe respondeu: “É patinho, espera vou cortar pra você…”
Devo ter feito uma expressão de puro terror, porque lembro vividamente que surtei.
Aos gritos, às lágrimas, dramático e escandaloso, joguei o prato ao chão e corri me trancar no banheiro (da rua Edmundo Monteiro, 69, Bairro Vila Paula, São Caetano).
Lá dentro eu me debulhava em lágrimas, mortificado porque minha mãe havia me servido a carne de um… patinho! Sim, eu pensei que minha mãe megera e demoníaca havia matado um daqueles patos amarelinhos que eu via nos livros e que agora estava me servindo a carne dele.
Trancado no banheiro, a única coisa que ouvia do lado de fora era minha mãe tendo um acesso incontrolável de risos, e as vozes preocupadas de meus avós tentando falar com ela ou algo do gênero.
O CHILIQUE
Encostada à porta do banheiro, ela mal conseguia balbuciar alguma coisa e já caía na gargalhada, ao ponto de ter começado a passar mal… Do lado de dentro, eu chutava a porta com todo ódio possível daquele ser insensível e malvado que eu chamava de mãe.
Não sei por quanto tempo fiquei trancado, mas algum tempo depois meu avô (que eu chamava de nono) veio bater à porta e me ordenar que saísse dali imediatamente.
Nunca tinha ouvido meu avô falar naquele tom comigo, de forma que saí na hora assustado. Ele me deu um tapão na cabeça, tentando esconder um enorme sorriso
“Tá vendo o que você fez? Mandou sua mãe pro hospital!”
O que ocorreu foi que minha mãe, que já tinha problemas de saúde, e além disso era uma exagerada por natureza, havia tido um ataque tão forte de riso que sofreu falta de ar, seguida de uma arritmia cardíaca.
De forma que minha nona foi com ela às pressas para a farmácia ou a um pronto-socorro –para colocá-la num balão de oxigênio. De tanto rir, ela estava com dificuldades de respirar.
Não entendi nada, mas só sei que daquele bife eu não cheguei nem perto.
O AÇOUGUE DO SEU AGOSTINHO
No dia seguinte lembro de minha mãe ainda com os olhos inchados, com um sorriso que hoje sei pertencer a uma pessoa dopada, ir me acordar.
Dona Anna me fez trocar de roupa, me pegou pela mão e me levou até o açougue do seu Agostinho, que ficava na rua Martim Francisco, uma rua paralela à da minha casa.
Lá, minha mãe pediu ao seu Agostinho para que me mostrasse o que era afinal uma peça de patinho. Explicou que eu havia chorado na noite anterior porque achava que ela tinha me servido a carne de um filhote de pato.
O açougueiro prontamente ergueu uma longa peça bovina, o que absolutamente não me convenceu.
Então minha mãe e seu Agostinho começaram a caçoar de mim, rindo aos borbotões, enquanto ela explicava o meu surto do dia anterior.
Enquanto isso eu esgueirei pela porta do açougue até a rua.
Na porta do açougue vi uma bituca de cigarro numa poça de água parada, e sabe lá deus o porquê, a peguei e engoli.
Só lembro de minha mãe em pânico, correndo em minha direção e gritando:
— NÃÃÃÃÃÃÃO…
Seja lá o que aconteceu depois (não lembro, desculpem), tudo que sei é que ficou em minha vida uma paixão e um carinho especial pelos patos.
Esses adoráveis anatídeos anseriformes, única espécie da Terra que anda, nada e voa por seus próprios meios biológicos. Cujos filhotes são as coisas mais fofas e amáveis para as crianças.
Especialmente as mais sensíveis. <3
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