Não foi no cinema, foi na TV. No final dos anos 60, minha família classe média (baixa) moradora numa minúscula rua da então Vila Paula, em São Caetano, tinha uma TV Telefunken.
A TV era um imenso e gordo tubo de imagem que se projetava para fora da também enorme caixa de madeira.
Depois disso havia um vidro grosso e um pouco inclinado que evitava que crianças tchongas encostassem no tubo e se queimassem.
Afinal, depois de algum tempo ligada as Telefunkens esquentavam como uma chapa de padaria. Não podiam ficar ligadas dias a fio como hoje.
Depois de apenas algumas horas a mãe ou a vó sempre vinham desligar. “É pra esfriar as válvulas.”
Foi diante dessa TV que, acredito, por volta de 1969, eu chorei pela primeira vez assistindo a um filme.
Eu devia ter cinco para seis anos e, se não me engano, foi na TV Record que passou o filme “Viagem ao Centro da Terra”.
Era uma adaptação do clássico de Julio Verne (1828 – 1905) com direção do lendário diretor judeu Henry Levin.
Creio que foi em 1969, porque o filme foi lançado nos cinemas norte-americanos exatamente 10 anos antes.
Naquele tempo acho que havia um intervalo proibitivo de uma década entre um filme sair das salas de cinemas e chegar à TV. Ainda mais numa TV de um país do então Terceiro Mundo.
Não era esse mamão com açúcar da Net Now ou Netflix que temos hoje, em que um filme ainda está nas telas das salas e já pode ser assistido via streaming. Não.
ERA UMA VEZ UMA PATA…
Todo mundo conhece a história de “Viagem ao Centro da Terra” então vou soltar todos os spoilers. Se nunca leu o livro, paciência.
No filme, James Mason intepretava o sagaz professor e cientista dr. Lindenbrook, e o ator Pat Boone era seu assistente ( Alec McEwan).
Eles montam uma expedição e se metem por locais ermos da Terra. Adentram cavernas e percorrem durante meses o caminho perigosíssimo até o centro do nosso planeta (spoiler 1: não tinha nenhum núcleo em fusão como aprendemos na escola, e sim um pseudonúcleo magnético).
Só que eles são acompanhados pelo vilão e invejoso Conde Saknussemm, cujo ancestral (Arne) séculos antes já havia encontrado uma pista de que havia um caminho para o centro da Terra.
Em vez de ajudar, o conde só atrapalha. Baita mala.
Bom, mas porque um moleque de 5 ou 6 anos de São Caetano iria chorar copiosamente num filme científico de ação?
Porque na expedição havia uma pata, Gertrude.
No final do filme, a expedição exausta dorme profundamente, exceto Saknussemm, que se esgueira feito um animal de rapina, rouba a pata e a devora crua mesmo.
No filme só apareceram as peninhas da pobre ave anatídea (abaixo).
Eu, obviamente, não resisti e caí no choro, para agitação da família Feltrin.
Só parei de chorar porque Saknussemm aqui fez e aqui pagou.
No filme de Levin, logo depois do patocídio ele encosta numa pilha de pedras soltas, que rolam sobre ele, que é morto esmagado.
Pra mim, uma delícia (além das lágrimas, esse deve ser meu primeiro mau sentimento de vingança na vida também).
Hoje, quase 50 anos depois, venho ao meu site fazer esta homenagem singela ao primeiro motivo que me fez chorar num filme: a pata Gertrude.
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